Jovem Padre: Dezenove anos? Dezenove anos é muito tempo minha filha.
Mulher: Foi na minha primeira comunhão.
Jovem Padre: Você quer dizer que só fez a primeira confissão?
Mulher: Bom… É.
Jovem Padre: Tudo bem. O importante é que você resolveu fazer a segunda.
Mulher: Claro.
Jovem Padre: Bom, já vi que essa vai ser uma confissão longa.
Mulher: Longa?
Jovem Padre: Dezenove anos de pecado é muita coisa.
Mulher: Ué. E quem disse que eu pequei tanto assim?
Jovem Padre: Minha filha, todos somos pecadores. Até a mais correta das Irmãs Marcelinas peca diversas vezes ao dia.
Mulher: Mas não precisa confessar tudo, né?
Jovem Padre: Claro que não, minha filha. Claro que não. Só mesmo os pecados capitais. Ou os que você julgar mais… mais…
Mulher: Pesados?
Jovem Padre: Bom. Eu ia usar outro termo. Mas acredito que pesado cabe neste caso.
Mulher: Pesado cabe?
Jovem Padre: Pesado cabe.
Mulher: Pesado cabe. Pesado cabe. Bom. Então vamos lá. (pausa) Eu devo começar pela ordem cronológica ou de trás pra frente?
Jovem Padre: O que você preferir.
Mulher: De trás pra frente.
Jovem Padre: Então vamos de trás pra frente.
Mulher: Bom. O meu último pecado pesado…
Padre: Sim…
Mulher: Ai, que vergonha.
Padre: Não precisa ter vergonha, minha filha. Lembre-se de que eu sou só o ouvido de Deus. Você não deve pensar em mim como uma pessoa.
Mulher: É justamente essa a questão.
Padre: Que questão?
Mulher: Do pecado.
Padre: Do seu último pecado.
Mulher: Do meu pecado corrente.
Padre: Pecado corrente? Pecado pesado como uma corrente?
Mulher: Não, padre. Pecado correte, pecado corrente.
Padre: Que você carrega amarrado ao seu corpo, como uma corrente.
Mulher: Não.
Padre: Que você exibe para todos como uma corrente no pescoço.
Mulher: Meu Deus, não tem metáfora! Corrente no sentido de que está correndo. De que é presente. De agora.
Padre: Seja mais clara.
Mulher: É que o meu último pecado meio que ta em curso. (pausa). Eu to pecando.
Padre: Está pecando?
Mulher: Neste momento.
Padre: Como assim, minha filha?
Mulher: Por ter entrado no seu confessionário. Por estar aqui, falando com o senhor.
Padre: Minha filha, a confissão está longe de ser um pecado.
Mulher: Mas é que eu to com tesão no senhor.
longa pausa
Padre: Minha filha, a confissão está longe se ser um pecado…
Mulher: Padre, você não ouviu o que eu disse?
Padre: Ela é um sacramento…
Mulher: Padre…
Padre: Que começa na primeira comunhão…
Mulher: Padre!
Padre: E acompanha o fiel até o leito de sua morte.
Mulher (alto): Padre, eu disse que to com tesão no senhor!
pausa mais longa que a anterior
Padre: Bom… É… De fato você tem um pecado corrente.
Mulher: Na verdade eu nem ia me confessar, sabe? Pra ser sincera, eu não sou muito religiosa… Eu até faço sinal da cruz quando vejo gente atropelada na rua e pulo as sete ondas no Réveillon. Mas igreja, igreja… Só casamento e batizado, sabe?
Padre (nervoso): Sei minha filha, sei…
Mulher: Mas hoje eu tava passando aqui na porta daí eu vi você… quer dizer… o senhor. (pausa) Ai, tão esquisito te chamar de senhor. Tu deve ter a minha idade, né não?
Padre: Vamos voltar ao pecado corrente, minha filha… Pecado corrente.
Mulher: Ai, desculpa. Enfim. Eu vi você entrando no confessionário lá da rua. Eu te achei tão gatinho, mas tão gatinho. E não foi só porque eu te achei gatinho não. É que. Sei lá… Eu acho que… Rolou.
Padre: Rolou?
Mulher: É. Rolou.
Padre: Rolou o quê, minha filha?
Mulher: Pára de me chamar de filha que se bobear eu sou mais velha que tu. Aliás, quantos anos você tem?
Padre: Isso não faz parte do sacramento da conf…
Mulher: É só uma perguntinha, padre.
Padre: É… 27.
Mulher: Jura?
Padre: É. Por quê?
Mulher: É que o senhor parecia ser mais novinho.
Padre: É mesmo? Sempre me dizem isso.
Mulher: Bom eu tenho 26. Mas acho que eu pareço um pouco mais velha.
Padre: Ah sim?
Mulher: É. Acho que é por causa do trabalho.
Padre: O que você faz, minha filha?
Mulher: Sou corretora de imóveis.
Padre: Olha! Meu pai era corretor de imóveis na cidade dele: Ipameri.
Mulher: A família do senhor é de Ipameri?A minha também! Por parte de mãe.
Padre: Que coincidência, minha filha! Eu nunca fui lá, mas dizem que é lindo.
Mulher: É uma graça… Que nem o senhor.
pausa ainda mais longa que a anterior
Mulher: Padre. O que o senhor acha de a gente continuar essa confissão… fora da Igreja.
Padre: Continuar a confissão?
Mulher: É padre, a confissão, a confissão. Vai continuar sendo uma confissão. Só que no boteco ali da esquina.
Padre: Ali da esquina?
Mulher: Ou lá perto de casa, que fica a uma meia hora daqui.
Padre: Bom… Eu não sei…
Mulher: Poxa, padre. Eu não vou poder terminar minha confissão? O senhor vai fazer isso comigo?
Padre: Não é isso, minha filha.
Mulher: É só uma confissão.
Padre: Mas vai ser uma confissão, não é?
Mulher: Claro, padre claro. Ainda uma confissão.
pausa
Padre: Bom… É… Sendo assim, eu acho que não há mal.
Mulher: Ai, que bom, padre, que bom!
Padre: Mas com uma condição.
Mulher: Qual?
Padre sai do confessionário, olha para mulher, pega-a pelas mãos, levanta e fica face a face com ela. Ele olha bem nos olhos dela e diz:
Eu continuo te chamando de “minha filha”, e você me chame de “senhor”.
Texto de Rodrigo Nogueira
Gostei da história do chiclete, de janeiro de 2010 (desabafos). Engraçado mesmo, e original. Decote, não há homem que não goste, mesmo os pelancudos, barrigudos, véio, crente, ateus. É sina. Nascemos, morreremos assim. ..........José Marcos.
ResponderExcluirGostei da história do chiclete (Janeiro de 2010-desabafos). Decote, não há homem que não goste, pode ser pelancudo, barrigudo, careca, véio, ateu, crente. É sina. ......José Marcos.
ResponderExcluirVou postar mais sobre meu dia-a-dia, pior é que vai dar muito texto e todos bem engraçados.
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